Preservação da Fertilidade

Postado em Artigos, Dr. Silval Zabaglia

A ocorrência de novos casos de câncer no mundo cresceu muito nos últimos anos. A Organização Mundial da Saúde estimou que no ano de 2008  surgiram aproximadamente 12 milhões de novos casos dessas doenças.

O contínuo crescimento populacional, bem como o envelhecimento e a mudança de hábitos relacionados à vida moderna, afetam de forma significativa a incidência e o impacto das neoplasias malignas. Os cânceres ginecológicos, principalmente de mamas, relacionam-se ao processo de urbanização da sociedade, apresentando maior risco entre as mulheres com mais elevado nível socioeconômico.

Concomitantemente, observa-se uma tendência mundial das mulheres em postergar a gestação, por motivos sociais, econômicos e culturais. Esse fato representa um fator de risco para a ocorrência dos cânceres ginecológicos, mamas e ovários, aumentando a possibilidade do diagnóstico ser feito antes de engravidar, trazendo possíveis complicações para a fertilidade futura ou mesmo durante a gestação.

Os avanços nos tratamentos das neoplasias malignas como novas técnicas cirúrgicas, planejamento radioterápico mais adequado e esquemas de quimioterapia mais eficientes, contribuiram para o aumento na sobrevida desses pacientes. No entanto, esses mesmos avanços representam riscos consideráveis para o futuro reprodutivo dessas mulheres.

A radiação ionizante da radioterapia tem efeitos adversos na função dos testículos e dos ovários em todas as idades. Esses danos estão relacionados às doses e o local de irradiação, variando de ciclos menstruais irregulares durante alguns meses até falência ovariana permanente. Apesar dessas complicações, se a irradiação não for feita durante a gestação, não existe risco de teratogenicidade. A quimioterapia reduz consideravelmente o número de folículos primordiais dos ovários. Como as pacientes mais jovens possuem uma reserva ovariana maior, os efeitos do tratamento sistêmico são menos importantes nesses casos. Os riscos de infertilidade e amenorreia dependem da idade da paciente, dos agentes quimioterápicos utilizados e da dose total administrada. Pesquisas publicadas referem que o tratamento quimioterápico acrescentaria dez anos a idade ovariana em termos de função reprodutiva.

A equipe multidisciplinar que acompanha os casos oncológicos na pacientes jovens e sem prole definida tem a responsabilidade de abordar os aspectos reprodutivos e de fertilidade. Deve-se discutir o desejo de engravidar, expor claramente o prognóstico da doença e as consequências do tratamento oncológico para o futuro obstétrico, oferecer aconselhamento, inclusive genético e psicológico, e encaminhar para o especialista em reprodução humana.

As opções para a preservação da fertilidade são a supressão ovariana com análogos do GnRH, criopreservação de embriões e oócitos e a criopreservação de tecido ovariano. A utilização de análogos do GnRH tem como objetivo diminuir os efeitos tóxicos da quimioterapia nos folículos ovarianos através da supressão dos hormônios hipofisários, ou seja, manter a paciente com o mínimo de estímulo hormonal sobre os ovários, para que os folículos primordiais permaneçam em repouso, e com isso, menor chance da ação das medicações quimioterápicas compromete-los. A criopreservação de embriões e de oócitos são métodos bem estabelecidos de preservação da fertilidade. As taxas de sucesso estão diretamente relacionadas a idade da paciente e a associação com outros fatores dificultantes da gravidez. Para a utilização desses métodos é necessária a indução da ovulação para obtenção dos oócitos, procedimento de captação e no caso da criopreservação dos embriões, os procedimentos para a fertilização.

Outra forma de se preservar a fertilidade nas pacientes que não terão tempo suficiente para a indução da ovulação e a captação dos oócitos é a criopreservação de fragmentos de tecido ovariano. A realização dessa técnica necessita da realização da videolaparoscopia, através da qual se retiram pequenos pedaços da parte externa dos ovários, os quais são preparados e criopreservados. Não é a primeira escolha para a preservação da fertilidade visto que a paciente é submetida a um procedimento cirúrgico pouco tempo antes de começar a quimioterapia, porem será a oportunidade que ela terá, no futuro, de engravidar com seus próprios óvulos.

A preservação da fertilidade também é indicada para as pacientes que desejam engravidar no futuro, que estão com mais de 35 anos e não têm parceiro ou não podem engravidar nos próximos anos por qualquer outro motivo. A conduta nesses casos é a mesma para as pacientes com neoplasias malignas, mas com a possibilidade de indução da ovulação sem um prazo definido e sem a urgência de se iniciar o tratamento quimioterápico ou radioterápico.